Editorial Outubro 2017

Valor, Preço e Meio Ambiente

Mangue – Ilha de Itaparica – 2015 (Foto: Karine Veiga / RHIOS)

Na ciência econômica com certa frequência discute-se as conexões entre valor e preço. Apesar do uso comum como sinônimo, em um contexto mais técnico onde a hermenêutica se configure como elemento de relevância para a discussão, busca-se muitas vezes identificar as conexões que convertem valores, de natureza subjetiva, em preços, objetivos e mensuráveis.

Contribuindo para essa discussão e buscando eliminar o excesso de subjetividade inerente ao termo valor, este é categorizado para melhor compreensão no processo de monetização. Daí surge o valor social, o valor cultural e o valor econômico, entre outros. Essa última categoria reduz a subjetividade do valor aos elementos que podem ser apropriados pelo processo produtivo. Nesse sentido, o valor cultural de uma determinada região pode ser reduzido as possibilidades de exploração da mesma, através do turismo.

De forma similar, ainda no contexto da ciência econômica, por vezes fundem-se os termos meio ambiente e recursos naturais. Contudo, fazendo uso da hermenêutica torna-se possível identificar as sutilezas que conferem a especificidade a cada um desses termos, novamente reduzindo o significado a partir do olhar da escassez e do processo produtivo. Em outras palavras, do ponto de vista da economia, tornam-se mais relevantes os elementos escassos ou passíveis de escassez disponibilizados pelo meio ambiente que tem a possibilidade de apropriação como insumo ou matéria-prima. Assim, a nascente do Rio São Francisco não seria de forma direta um recurso natural, embora seja ela a “responsável” pelas águas que movem as turbinas de grandes usinas hidroelétricas como Paulo Afonso.

Surgem assim diversos elementos para profundas e infindáveis discussões. O meio ambiente, enquanto elemento de análise, é extremamente vasto e multidisciplinar. As distintas abordagens da biologia, da geografia, da física ou da hidrologia pouco se assemelham entre si ou com a própria ciência econômica havendo muitas dissonâncias e apenas algumas convergências, sem que nenhuma delas, entre as diversas outras áreas de conhecimento que exploram a temática, possa ser classificada como “a mais importante”.

As similaridades e especificidades então inerentes aos termos valor, preço, meio ambiente e recursos naturais revelam assim uma complexa interação que causa conflitos e desentendimentos nas discussões técnicas sobre o assunto e, consequentemente, sobre as políticas e demais regulamentações que buscam normatizar o processo decisorial. Monetizar punições decorrentes do desperdício de água ou dos malefícios da poluição torna-se uma controvérsia que mescla valores, em sentido amplo e restrito, com o entendimento do que vem a ser ou não um “recurso natural” e não um simples(!!!) elemento do meio ambiente. E assim, ao precificar a energia elétrica a ser gerada por Belo Monte considera-se o preço do serviço e das obras, deixando do lado o valor do recurso hídrico utilizado visto que naquela região não há escassez.

Essas discussões perpassam todas as questões relacionadas a sustentabilidade, entendida como uma característica das ações que permitem a satisfação de necessidades atuais, sem o comprometimento da satisfação de necessidades futuras. A sustentabilidade impõe a necessidade de reconhecer o “valor econômico” de recursos naturais independentemente da sua escassez. Ademais, o compromisso intergeracional inerente ao termo exige a multidisciplinaridade e o respeito mútuo entre os diversos profissionais e leigos envolvidos, fortalecendo assim a necessidade de “mais valor” e “menos preço”.

Telma Teixeira.
RHIOS
Outubro 2017

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